quarta-feira, 18 de abril de 2012

Energia fotovoltaica começa a ganhar corpo no Brasil, mas esbarra em pendências

Houve avanços significativos nos últimos 12 meses no Brasil no setor de energia solar fotovoltaica (FV), mas ainda há poucas instituições de pesquisa envolvidas, os recursos humanos qualificados são escassos e faltam definições do governo para fomentar o mercado. Essas são algumas das principais conclusões do 2º Workshop Inovação para o Estabelecimento do Setor de Energia Solar Fotovoltaica no Brasil (Inova FV), realizado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) nos dias 13 e 14 de março. O evento, promovido pelo Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (NIPE) da Unicamp e pela organização não governamental International Energy Initiative (IEI), teve como objetivo abrir um espaço de debate entre os agentes brasileiros e estrangeiros interessados no desenvolvimento dessa cadeia produtiva no País.

Uma das principais iniciativas recentes no setor foi a chamada nº 13 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), voltada para pesquisa e desenvolvimento (P&D) em energia solar, que contou com 18 projetos qualificados, envolvendo 96 empresas (entre proponentes e cooperados), 62 instituições de ensino e pesquisa e 584 pesquisadores. Essa ação do governo federal foi apontada pelos participantes do Inova FV como uma importante contribuição para o setor, pois pretende ajudar a inserir a geração solar na matriz energética brasileira. Os projetos qualificados pela agência totalizam cerca de R$ 400 milhões e prevêem uma geração de 24,5 MWp no prazo de três anos. Cinco desses projetos contam com a participação da empresa brasileira Tecnometal, a única do País que fabrica módulos FV e que iniciou sua produção em 2011 em Campinas (SP). Neste ano, o Inova FV reuniu 420 pessoas no auditório da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, um aumento de 50% em relação ao número de inscritos da primeira edição, realizada em março de 2011.

As instituições acadêmicas, que deveriam ter um papel importante no estímulo à inovação, têm uma atuação ainda tímida no desenvolvimento de tecnologias na área de energia solar FV, mas oferecem uma contribuição maior no desenvolvimento de aplicações dessas tecnologias, afirmou Ricardo Rüther, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), durante palestra no evento. Para ele, os laboratórios das instituições de pesquisa brasileiras, em geral, ainda são mal equipados para atender às necessidades do setor. "Nossos laboratórios começam agora a fazer uso dos mecanismos de incentivo para pesquisa e desenvolvimento, como o P&D Estratégico, da Aneel, que está sendo tão esperado e deve equipar essas instituições um pouco mais", previu Rüther.

Falta de pesquisadores

Outro problema, no aspecto da formação de recursos humanos, lembra o professor da UFSC, é que não existem cursos de graduação na área de engenharia solar ou em energia solar, apesar de haver vários cursos de pós-graduação. Para ele, o mesmo ocorre nas escolas técnicas do País, onde o desconhecimento sobre o setor é a regra. Rüther prevê que o programa Ciência Sem Fronteiras (CSF) poderá contribuir muito para a capacitação nessa área, tanto com o envio de estudantes de graduação e pós-graduação a outros países, como com a vinda de pesquisadores do exterior ao Brasil.

Um dos reflexos dessa escassez de profissionais ficou visível na própria chamada nº 13 da Aneel: inicialmente a agência exigiu experiência e titulação na área fotovoltaica para os coordenadores dos projetos, entretanto, a falta de pesquisadores fez com que fosse aberta uma exceção e permitiu-se a contratação de pesquisadores que tivessem currículos apenas na área de energias renováveis, de uma maneira mais ampla. "A ideia é criar uma demanda. Criando a demanda, a oferta de profissionais a seguirá, com a especialização dos pesquisadores nesse tema", defendeu Fábio Stacke Silva, da Superintendência de Pesquisa e Desenvolvimento e Eficiência Energética da Aneel. No entanto, Rüther, da UFSC, demonstrou inquietação com a falta de experiência dos coordenadores nessa área. "Estamos preocupados para saber se grande parte desses projetos efetivamente terá P&D e se levará para frente a fronteira do conhecimento nessa área", questionou Rüther.

Geração distribuída em residências

Enquanto o programa P&D Estratégico da Aneel tem seu foco mais voltado para a geração de energia elétrica FV no atacado, por meio de usinas conectadas à rede de distribuição ou transmissão, a questão da geração distribuída em unidades residenciais ainda depende do resultado de uma audiência pública convocada pela Aneel e é essencial para a expansão do setor. Assim como ocorre na Europa — continente que concentra 75% da capacidade instalada de energia FV do mundo —, o Brasil está discutindo a regulamentação do consumidor que decide instalar seu equipamento FV em casa para gerar sua própria energia e ganhar créditos da concessionária pelo excedente produzido. Esse sistema, chamado de compensação energética (conhecido no exterior como net metering), deve ter suas regras definidas ainda em 2012, de acordo com a Aneel.

A Alemanha hoje conta com cerca de um milhão de geradores fotovoltaicos, a maioria deles em tetos de residências e conectados à rede de baixa tensão, totalizando 24 GW instalados em operação, segundo Ricardo Rüther. Desse total, 39% estão na residência ou empresa de indivíduos. "Nós defendemos que o Brasil deva incentivar a adoção em massa de pequenos sistemas fotovoltaicos urbanos, dispersos e conectados na baixa tensão, e se preparar para a viabilidade econômica — que não existe ainda, mas está chegando perto — das grandes usinas fotovoltaicas centralizadas", disse Rüther. Para ele, apesar de os custos de produção de energia FV estarem continuamente caindo, há uma grande incerteza ainda sobre os valores para um leilão de energia desse tipo.

Roberto Zilles, professor do Laboratório de Sistemas Fotovoltaicos do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), defendeu que é necessário primeiro se definir quanto custa produzir energia solar FV no País, para posteriormente se definir as políticas de fomento. Segundo ele, enquanto empresas estrangeiras afirmam que seria possível produzir esse tipo de energia a valores inferiores a R$ 200 o MWh, as empresas que fazem parte do grupo setorial da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), formado por companhias instaladas no País, mostram números maiores. "Nós não estamos avançando nisso e estamos dando uma sinalização errada para o setor", criticou Zilles. "Temos que definir quanto custa para se definir as políticas. Não podemos pensar em uma situação conjuntural, em que poderíamos aproveitar o fato de estarem sobrando módulos no mercado, porque isso é uma bolha. E nós não queremos uma bolha no País, queremos desenvolver a indústria e utilizar o sol, não só importando."

Cadeia fotovoltaica

Eduardo Tosta, especialista em Projetos da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), anunciou durante o Inova FV que o governo vai lançar a nova agenda setorial para a área de energia solar em abril, contendo propostas para o desenvolvimento da cadeia industrial, com diagnósticos de tendências de demanda no Brasil e no mundo, de organização industrial e estrutura produtiva e de mudanças tecnológicas. Valdênio Araújo, analista da ABDI, apresentou no evento os primeiros resultados de um estudo de avaliação de desempenho tecnológico da indústria de bens de capital para energias renováveis, que deverá ser publicado em maio. Esse levantamento foi encomendado ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e está atualmente em fase de revisão final.

"Para se construir uma unidade produtiva no setor que concentra o maior valor agregado dessa cadeia, que é o de fabricação de silício grau solar, o custo médio, segundo o estudo, com dados de 2008, seria de US$ 250 milhões. Para a produção de wafers [lâminas de silício utilizadas nas células], a média seria de aproximadamente US$ 40 milhões. Em contrapartida, na produção de módulos, em que já temos competência instalada no Brasil, a estimativa do custo de instalação de uma fábrica é de US$ 2 milhões", detalhou Araújo. De acordo com a ABDI, no mundo há atualmente 75 empresas que produzem silício grau solar, 239 empresas que fazem células e cerca de mil companhias que fabricam módulos.

Notícia retirada do Inovação UNICAMP.

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